Mercadona

 Este ano, os operadores turísticos da zona do Algarve, Tróia e praia do Samouco foram surpreendidos pela súbita e completamente inesperada mudança no destino de férias das populações residentes nas áreas concelhias de Setúbal e Montijo que, sem que nada o pudesse antecipar, passaram de frequentar estas zonas ancestralmente turísticas, para tomarem de assalto a nova coqueluche do turismo nacional…. o Mercadona.
As senhoras pindéricas que nos meses de Verão se pavoneavam nos seus vestidos de feira, rua acima rua abaixo pelas avenidas principais de Quarteiras, Albufeiras e Armações de Pêra a empurrar carrinhos de bebé acompanhadas pelos seus consortes trajados de calções com vinco bem desenhado a ferro de engomar e pólos de riscas horizontais que dão aparência de globo terrestre às suas barrigas de cerveja, exibem agora as suas esmeradas toilettes pelos corredores do Mercadona a comprar Henos de Pravia e latas melocotón en almibar.
Na realidade a ideia não é tão disparatada como parece pois as semelhanças com o Algarve começam logo à entrada do parque de estacionamento que forma filas da dimensão das que antigamente se formavam na N1 em Canal Caveira e na Mimosa, só com a diferença que nesta fila não se come cozido à portuguesa nem bifanas no pão, espera-se simplesmente por um lugar no parque. Muito recomendável para os saudosistas daquelas esperas intermináveis à braseira do sol.
Já lá dentro, populam os vestidos da moda em vermelhos e verdes fosforescentes justinhos ao corpo a modelar cus de arroba onde se consegue adivinhar o fio dental e barrigas de alqueire que impedem as proprietárias de se chegar ao expositor das hortaliças, sob pena de serem confundidas com melancias ou alfaces iceberg e levarem um bom banho de vapor de água para se manterem viçosas.
Tal não é exagero como poderão julgar, domingo, quando tive o desprazer de lá entrar, estava eu muito convencido que estava a apalpar um melão pele de sapo e só quando ouvi um “elááá!” é que reparei no meu engano e pedi desculpa à ciganita.
Também ali, como nas Avenidas do Mar e outros nomes igualmente poéticos que dão nome à avenidas algarvias que separam o amontoado de prédios do oceano, os carrinhos de bebé e de compras atravancam corredores impedindo a passagem a toda a gente perante a indiferença das progenitoras que, de beiças pintadas e cabelos arranjados como se fossem convidadas para a mesa dos noivos no casamento da prima que veio da Suíça, põem a conversa em dia com as vizinhas como se não se tivessem visto à menos de 15 minutos de bata e alpargatas nas escadas do prédio.
De vez em quando, lá ouvem uns brados pelos Rubens, pelos Tiagos André e pelas Silvanas que correm como pequenos diabos pelos corredores empurrando os clientes e empregados com os seus dedos peganhentos de guloseimas que as mães lhe deram para terem um pouco de paz.
Os maridos, enfastiados, parecem não dar por nada e só quando a mãe grita um pouco mais alto por algum dos pequenotes é que eles ecoam com voz grave “Andrééée”, sem tirar os olhos da prateleira das aceitunas sin huesso ou do jamón ibérico à fatia.
O Mercadona, tornou-se a 5.ª Avenida dos pobretanas que passeiam de prateleira em prateleira como se estivessem a ver as montras da Prada ou da Cartier apenas para descobrirem exactamente os mesmos produtos que existem nas outras superfícies comerciais só que para dar um ar mais internacional à coisa puseram um ñ em vez de n nos rótulos dos cremes de duche. Temos de convir que Crema de Baño é substancialmente mais chique que Creme de Banho, tenha ele óleo de Argã, pétalas de rosa ou bagos de romã.
Até parece que estamos em Ayamonte… ou em Ayamonté, como dizem os veraneantes que atravessam o Guadiana com os sacos do Pingo Doce vazios para os encher de várias embalagens de líquido para lavar o chão na outra banda.
A pouca diversidade de produtos e a razão de pouco variarem dos outros supermercados é desmentida pelos responsáveis pela cadeia de supermercados, que afirmam que a Mercadona em Portugal possui os mesmo artigos que os supermercados em Espanha… só que adaptados ao gosto dos portugueses. Ou por outras palavras e das duas uma: ou os espanhóis têm em muito baixa conta o gosto dos portugueses, ou aproveitam para por cá a porcaria que na terra deles estão lá para um canto dos supermercados onde ninguém lhes pega e vêm ver se os pelintras cá do burgo os livram do stock.
Sinceramente, depois da minha visita e já em casa a refazer-me da desilusão, fiquei admirado por não ver lá à venda pacotes de meias turcas com uma risca azul e outra branca na zona do tornozelo. Ainda perguntei à Teresa se não as teria visto por lá mas não, confirmou-me, não havia. Menos mal, ou não havia ou, ainda pior, já as tinham comprado todas.
Naturalmente quem me conhece sabe que esta minha análise é um pouco exagerada, na realidade não havia lá nenhum miúdo chamado Tiago André.
 

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