Bond, James Bond
Já passaram por aquela situação de se sentirem no mínimo irresistíveis? É natural que não porque são pessoas normais. Até eu, que sempre estranhei o facto de não ter todas as mulheres do mundo e planetas adjacentes a cair-me aos pés - naturalmente por não conseguirem transpor para palavras e acções a imensidão da minha beleza e inteligência - nunca tinha passado por isso... até sexta feira passada.
Tudo começou à entrada do barco, quando uma trintona, que nunca tinha visto mais gorda, me brindou com um sorriso que parecia conter três circos chen dentro dele. Aquele sorriso de filme, que todos sonhamos ser alvo pelo menos uma vez na vida. Aconteceu-me a mim naquele terminal marítimo que agora sempre me parecerá escuro e sem graça.
Já no barco, uma moça que ia a entrar foi detida por um apertão no braço da amiga que, com um movimento subtil do queixo, apontou para mim.
Não posso garantir mas acho sinceramente que disseram: Que giro! - e dois sorrisos escorreram-lhes dos lábios.
Epá, - pensei ajeitando-me no banco - isto hoje está a correr bem!
A seguir mais duas moças e essas posso garantir que disseram mesmo "Que giro!".
Naturalmente que fiquei orgulhoso, não é que eu seja muito de me gabar,, mas um gajo fica contente quando finalmente lhe reconhecem o mérito.
De peito cheio sai do barco e percorri as ruas de Lisboa. Por todo o lado sorrisos cúmplices do mulherio. Apetecia-me ensaiar uns passos de Fred Astaire e começar mesmo ali a cantar Just Walking in the rain. Parecia-me que era apropriado e iria colher imensos aplausos e, quem sabe, saltar definitivamente para a fama.
No metro foi um grupinho de teenagers que se deleitaram com a minha presença e apontaram despudoradamente para mim com gargalhadinhas e gritinhos.
Meus Deus, como eu me andei a desperdiçar todos estes anos!
Em Arroios uma, de cabelo e lábios escuros, trajando à gótica, decide-se finalmente e aproxima-se de mim:
- Tão giroooo, - diz com uma voz mais suave do que os seus trajes deixavam adivinhar. - Posso tocar?
Olhei para ela. Se podia tocar?
Bonita e agora podia ver que os seus olhos também eram escuros e brilhavam sob o risco preto que lhe enfeitava as pálpebras.
-Tocar-me?
- A si não. A ele.
- Ah, não é um ele, é uma ela
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