Uma questão de fermento
Faço actualmente parte de um grupo no Facebook que quer recuperar os saberes ancestrais do fabrico artesanal de pão, desvendando os segredos da fermentação natural, que permite recriar produtos com sabores complexos e texturas únicas que a produção industrializada fez há muito esquecer.
Comecei assim na passada segunda-feira a min
ha jornada de tentar produzir o meu próprio levedante, utilizando produtos tão à mão de semear como um frasco de vidro, farinha integral, água e outro um pouco que é mais difícil de encontrar: paciência.
A fim de criarmos uma maior empatia e sentido de responsabilidade sobre aquele elemento vivo que nos propusemos a criar, o nosso orientador aconselhou-nos a baptizar os bichinhos que começavam a borbulhar naquela maternidade de vidro.
Imediatamente começaram a surgir os mais variados nomes na sua maioria propostos pelas senhoras do grupo e assim nasceram Zés, Fermentinhos, Albertos, Óscares, Mixus, Patinhos, Borbulhinas, Mentinhos, etc, etc, etc. Assentes os nomes na Conservatória e agendado o dia do baptismo, não tardou que as tutoras começassem a tratar a amálgama pelos nomes próprios e a perguntarem umas às outras como estava o seu Zé, se o seu Borbulhinhas estava a dar sinais de vida e se o Mentinho estava a crescer bem.
Confesso que a princípio achei a ideia estúpida e resisti a baptizar aquele pântano acastanhado que descansava no fundo de um velho boião de mel, mas, depois de ler tão interessantes diálogos comecei a sentir-me um pouco à parte e decidi então aderir à moda e atribuir um nome ao meu fermento salvaguardando que, caso ele viesse a vingar, não viesse a sofrer futuros problemas psicológicos e vai de pensar num nome mais ou menos simpático. Mas, ó sorte minha, parecia que todos os nomes bons para um fermento já estavam escolhidos por alguém e, por mais que me esforçasse, só me vinham à cabeça nomes como Fermentinhos, Mixus e Mentinhos. Será que o meu fermento estava destinado a ficar sem nome e talvez morrer sem ser baptizado? Haveria um Inferno para fermentos?
E aterrorizado por estes pensamentos, olhei para a bancada onde ainda estava a colher de pau com que tinha mexido o ser pouco antes e decidi-me num repente: “Olha, já que Colher não pode ser, ficas Pau!” e, muito contente, não tardei a a comunicar ao grupo o nome do seu mais recente membro.
Estranhamente e contrariamente ao que eu esperava, nunca qualquer uma das senhoras se pareceu interessar minimamente meu fermento e nem sequer uma delas se deu ao trabalho de perguntar como é que estava o meu Pau ou se estava a crescer ou não e, acreditem ou não, 80 % delas bloqueou-me quando eu disse que me parecia que o meu Pau estava a finalmente a dar sinais de vida e após um período de repouso tinha começado a levantar.
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