Sugestões de gratificação
Aproveitando o intervalo entre a notícia, explorada até à exaustão pela comunicação social, do beijo de um treinador careca a uma jogadora e os milhares de fotografias de nuvenzinhas que estão diariamente a ser publicadas no Facebook com perguntas estúpidas sobre o nome das mesmas, desde que no dia 28 de Agosto enfeitaram os céus de Lisboa umas altocumulus lenticularis, tive o desprazer de ser apresentado a uma manhosice extorsionária inventada pelos profissionais da restauração a que eufemísticamente chamam de “sugestão de gratificação”.
Pretendem os galegos apresentar no final da refeição aos incautos clientes, dois preços: um com o valor dos bens consumidos, mais Coca-Cola, menos Coca-Cola, e outro incluído a referida “sugestão de gratificação” que acrescenta mais 5% ao total da refeição e que servirá segundo a associação de extorcionistas, que consegue dizer estas coisas sem se rir, para motivar os empregados de mesa a prestar um melhor atendimento ao Cliente, entenda-se isto como, sem enfiar os dedos na sopa e colocar um pouco de desodorizante quando pegam ao serviço.
Naturalmente que, por agora, é apenas uma “sugestão” e caberá ao Cliente decidir se paga a gratificação ou não. Mas caberá mesmo ao Cliente decidir? A verdade é que esta sugestão se assemelha muito à “sugestão de gratificação” que os arrumadores de carros nos dão pelas ruas de Lisboa “destorce, tá bom patrão. Pode deixar aqui que eu tomo conta do carrinho”, que sempre nos deixa a impressão de que se não acudimos à mão estendida, quando voltarmos temos o carro com um artístico risco na porta.
Se formos um Cliente ocasional do restaurante podemos com toda a segurança mandá-los à fava e arrancar dali sem largar mais um tostão, tal qual como o fazemos quando o arrumador apenas nos aborda quando vamos retirar o carro do estacionamento. Mas se formos um Cliente habitual? Podemos dizer que apenas pagamos a refeição e com isso assegurar que no dia seguinte as favas que pedimos ao empregado não são os restos daquele senhor que acabou de almoçar mesmo antes de nós nos sentarmos? Conseguimos garantir que não temos que esperar mais meia hora do que o Cliente da mesa do lado para que um empregado nos atire o menu para cima da mesa com maus modos?
É que até à data sempre pensei que cabia ao empregador motivar e exigir dos seus trabalhadores o melhor de si, pagando-lhes vencimentos que remunerem justamente o seu esforço, que é muito, e dando-lhes um ambiente de trabalho saudável e não esperar que seja o Cliente a motivar o seu pessoal com gorjetas. Sendo assim é fácil continuar a atrair mão-de-obra com ordenados miseráveis e promessas de boas gorjetas como complemento do ordenado.
Resta saber se estes galegos estão também dispostos a pagar estas “sugestões de gratificação” aos seus fornecedores, tanto a montante, quando vão adquirir a matéria prima aos mercados e ás transportadoras, como a jusante, como, por exemplo, quando contratam serviços de Segurança e Saúde no Trabalho. Estarão dispostos a pagar mais 5% para serem bem atendidos pelo médico do trabalho ou é obrigação dele consulta-los o melhor que sabe? Mas isso não sei, porque o senhor que estava a falar sobre isto não abordou esta vertente.
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